Um velho novo fim de semana
Diário: dia três
Um novo velho fim de semana - por Adriana Bernardes
Da mesa da sala de jantar, conjugada com a sala de TV (não se engane, estamos falando do melhor dois quartos do planeta Terra, quiçá do espaço Sideral), suspiro pela minha flor de maio. É a primeira vez na vida que uma flor de maio floresce nas minhas mãos! E está sendo incrível acompanhar a abertura dos botões. Ela é branca. Perto da folha, tem um leve esverdeado. Por dentro, uma pitada de rosa. Vê-la florescer tem alegrado os meus dias.
Também tenho dois cactos florescendo. Um deles é repleto de espinhos com uma delicada flor branco gelo, puxado para um amarelo bem desbotado. O outro, tem menos espinhos e a flor é de um vinho intenso, semelhante ao que estou tomando agora. Um chileno, carbernet sauvigon de R$ 22 a garrafa. Justo. Justíssimo!
O cheiro de frango revogado invade o apartamento. Hoje teremos strogonofe. Do quarto, o som da bola batendo na porta dos armamários, a gargalhada do meu pequeno, a minha menina grande tentando manter as regras do jogo, e a voz do pai conciliando a brincadeira...Sons e cheiros que aquecem meu coração. Ecoa ainda uma variação de músicas: de Stand by me (Playing for Change) a Eu e você sempre (Jorge Aragão).
Ontem, em vez do clube pela manhã, desenhamos, montamos quebra-cabeça, jogamos futebol e dançamos. O dia de amanhã? (Uma confissão: meu ponto de interrogação está de quarentena. Tive que buscá-lo no google, colar no bloco de notas e colar aqui. Sim, quarentões, às vezes, percorrem o caminho mais difícil! Mas no fim o resultado é o mesmo). Não sei!
Talvez eu esteja de home office. E não será fácil, acredite! Amo meu lar. Adoro ficar com minha família. Tenho a maior vocação para madame — apesar de os meus amigos e conhecidos duvidarem devido a seriedade com que encaro meu trabalho. Mas será um alívio se isso acontecer! E um desafio.
Enquanto escrevo, recebo fotos dos meus pais fazendo churrasco. Só os dois. Vivemos a 430 km de distância. Ele, 72, ela uma década mais nova. Na semana que passou, tivemos uma briga virtual, eu e meu pai. Ele insistia em sair para trabalhar. Não queria mais saber de coronavírus. Não admitia o isolamento. Insuportável para ele ficar em casa "sem fazer nada".
Não o vejo parado. Mas apelei para a chantagem emocional. "Se você continuar saíndo, coloca em risco a saúde da minha mãe e a sua" (ela diabética e ele, hipertenso). No dia seguinte a minha irmã, que vive há apenas alguns quarteirões, mas não tem ido vistiá-los para proteger a todos, ligou. Chorou ao telefone. Apelou para que ele ficasse em casa. E ele, então, prometeu que ia sossegar o facho. Respiramos todos aliviados (eu, minha irmã e meu irmão), cientes do sacrifício que isso representa pra ele.
E o domingo, como está sendo? Não estou de plantão, como já disse. Mas estou atenta aos grupos de trabalho. Tenho recebido mensagens e denúncias de pessoas que não conheço. Uma hora, incluo na pauta de matérias. Outras vezes, informo números para denúncias de irregularidades. Porque nem tudo é furo. Nem tudo é só pela matéria. Nunca foi e nunca será! A vida acima de tudo. O bem-estar do outro acima de qualquer coisa.
Se puder, #FiqueEmCasa.
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