Plenitude
Começou com a minha antipatia (recente) de repetidos banhos da cabeça aos pés. Finquei os pés em casa e recusei a descida na área verde do prédio. Me propus a fazer a janta das crianças: arroz com lentilha, feijão e carne moída. No meio disso, antecipar a faxina de sábado.
Por Adriana Bernardes
Entre amassar o alho e chorar copiosamente com a cebola, o coração deixou de bater. Começou a cantarolar descompromissadamente. A casa vazia, o silêncio em volta e o barulho dentro do peito….um barulho bom, enfim!
“Afoguei” a carne (sim, lá pras bandas de Minas, ninguém refoga nada. A gente “afoga” toda e qualquer comida e fica bão demais da conta!). O coração ali, cantando. “Mas o que eu quero ouvir?” Não houve resposta na razão. “Hummmm, já sei, quero dançar. Mas o que? Ele no tum, tum, tum ritmado. Num ritmo desconhecido, pleno de vontade……
Os planos de antes, de adiantar a faxina....esquece!. "Amanhã tem tatoo do meu viking." Credo, quanta louça suja". Enquanto isso, seguem o batuque e o baile dentro de mim.
Alcanço a taça, sirvo o restinho de vinho, abro a geladeira. As seis bandejas de cogumelos eram para a massa do fim de semana. Eram. Papel alumínio, sal rosa, alho poró, pimenta dedo de moça e cumari, lascas de cebola, um cadim de alho, shoyu e azeite.
Tum, tum, tum . Ok, você venceu!
Last kiss é a primeira (ainda durante o preparo dos cogumelos). Sim, eu sei que é uma canção triste, especialmente para alguém como eu, sensível às tragédias diárias no trânsito. Em minha defesa, devo dizer que minha paixão por Last kiss vem de antes de eu consultar o Google para saber da tradução.
Ouvi uma, duas, três vezes seguidas (sou dessas). Na terceira, dancei sozinha na sala: taça na mão, olhos fechados, riso no rosto, nada na cabeça. Finalmente o corpo e as batidas do coração estavam em sintonia. (Ah, tropecei no patinete e quase caí. A perfeição, só nas telas de cinema)
Mais uma do Pearl Jam (não lembro o nome). Tentei Tracy Chapman, veio Baby can I hold you. Amo. Mas, não era isso. O tum...tum...tum batia por algo mais visceral! The best, da Tina, era perfeito!
Arredei o sofá e dancei como Tina (ou pelo menos tentei). O cheiro de comida fresca, o aroma do vinho, o calor abafado de dezembro na capital e um encontro comigo mesma. Sem medo, sem o amanhã, sem o ontem, só o agora, segundo a segundo. E o agora, é música, vinho, rodopios, risos, suor, cabelos desgrenhados num coque frouxo, serenidade…..Dancei Tina de novo. Não, não foi outra música. Foi The Best novamente!
E depois de tina, o que vem? I will survive, com a Glória Gaynor. E depois dela? Hotel California. Amo! Confesso que foi a primeira música que me veio à mente nesta noite de quinta. Mas é tão clichê na minha playlist, que resisti enquanto pude! Mas quer saber? Que se dane!
Cantei e dancei como há muito não fazia! A taça de vinho chegou ao fim. A chave gira na porta. “Mamããeeeeee, chegamos! Posso te abraçar, posso te abraçar?”. “De jeito nenhum! Não toque no rosto, máscara de proteção e roupa suja direto na máquina. Vá pro chuveiro e banho da cabeça aos pés”.
Meu vinking mascarado (novos tempos, tempos de pandemia) entra pela sala. Basta um olhar. Banho, de criança, janta de criança, criança na cama! Tum..tum...tum… tem outros desejos! A fornada de cogumelos assados está fumegando. Mais dois dos meus clichês ecoam pela casa: Stand by me e Every breath you take! Esses dois, juro, foi o youtube quem escolheu pra mim.
(Não) Diário de uma pandemia de covid-19.
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